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Carta aberta aos colecionadores típicos de carros

Enviado: 15 Mar 2011, 19:35
por brunollo
Thom Douglas compartilha conosco seu amor por carros clássicos e seu desprezo por uma leva antiga de donos que acham que clássicos devem acumular valor, ao invés de quilômetros, deixando-os fora do alcance da nova geração – um fenômeno que só aumenta no Brasil também.

Começo a ficar cada vez mais incomodado com o fato de não ter um carro, em condições ou não de rodar. Este incômodo aumenta exponencialmente quando “saio” para procurar um carro no Craigslist. Eu acho um no qual tenho algum interesse (geralmente entre os finais da década de 1930 e 1960) e então eu vejo o preço.

Quando você pede milhares de dólares por uma carcaça de um “substitua-pelo-nome-de-um-modelo-meio-raro” enferrujado, desmontado e talvez incompleto, você (sem querer, claro) provavelmente não quer vendê-lo para ninguém com menos de 40 anos. Assim você, fã “antigo” de carros, se revolta e começa a reclamar que “sua antiga cultura de carros” está morrendo porque nós, a nova geração, parecemos desinteressados em sua cultura.

Novidade, velhote(s): não é que não estamos interessados, pelo contrário, estamos muito interessados.

O problema é que você pede por esses carros “colecionáveis” valores ridiculamente altos. Então, você gastou metade de sua aposentadoria o restaurando. Mas ninguém mandou você fazer isso. Sim, o carro está ótimo, mas não espere recuperar o dinheiro que você gastou nele, ou o que quer que seja que essa-ou-aquela-tabela diz que o carro vale.

As únicas pessoas que podem comprar esses carros imaculadamente restaurados são as pessoas da sua idade. Não surpreende que a cultura de carros clássicos esteja morrendo. As únicas pessoas que podem comprá-los estão literalmente… morrendo.

Agora, para ser justo, não tenho problemas com um clássico “em boas condições”, com preço razoável. Se o acabamento está bom, a lataria decente, e há pouco ou nenhum sinal de ferrugem, são provavelmente Carta aberta aos donos e colecionadores típicos de carros clássicos">100 Benjamins bem gastos.

Mas quando você vai para a internet e publica o anúncio de um Chevy ou Ford “produzido aos milhões, mas que é raro com certeza” enferrujado, sem condições de rodar, e pede US$ 10.000, isso está longe de ser um bom fim para 100 Benjamins. Pelo contrário, é um belo desperdício de dinheiro. E tempo, tanto da sua parte quanto da parte dos leitores e compradores.

Toda hora vejo anúncios de carros clássicos com pouca quilometragem (60 a 80 mil quilômetros), em bom estado. E então vejo os US$ 6.000 pedidos. É um negócio da China da minha opinião. Meus anúncios favoritos são aqueles que oferecem carros das décadas de 1930/40/50 e no texto incluem algo como “foi/é meu carro do dia-a-dia”. Muito bem feito, senhor.

Mas não posso justificar dar uma herança milionária por um carro em perfeitas condições que você deixa parado em sua garagem durante os intervalos entre feiras e encontros. Não ligo que nunca tenha tomado uma chuva ou até neve. Sabe o que isso me diz? Me diz que esse carro não é para você. Me diz que você pensa que ele é uma espécie de troféu. Algo para ser visto e nunca ser guiado pelo medo de sabe-se lá o que.

Se não está em bom estado porque você foi negligente, então me diz que o carro vale menos para você do que para aquele que pensa que é um troféu. Me faz pensar que você vê nele algo como um lenço de papel: algo para se livrar e esquecer. Já que esse parece ser o caso, você deveria simplesmente jogar o preço para “grátis”.

Mas de volta aos carros imaculadamente restaurados e nunca guiados.

Ainda que uma ou duas peças sejam difíceis de encontrar. Não muda o fato de ser um desperdício não usar o carro. Não fique sem usá-lo porque você está com medinho de que vai quebrar. Vá dizer a uma criança para não andar porque ela vai cair…

Clássicos não são “especiais”. Eles não são “raros”. Não foram feitos para serem postos sob uma redoma para que uma criança não toque nele. São carros, feitos para rodar, aproveitar, usar e apreciar. Não o pseudo-rodar/gostar/usar ou amar que acontece com muitos clássicos. Se você tem uma paixão real e sincera por automóveis, não apenas clássicos, você vai entender este texto. Caso contrário, lamento ter desperdiçado seu tempo. Se quiser, me envie (em inglês) um e-mail revoltado para que eu possa tirar um sarro em um texto futuro.

Thom Douglas adora barcos, carros clássicos e vocabulário educado; gin Martinis, Manhattans, Southamptons, ou um bom Scotch; jazz ou músicas que sejam igualmente relaxantes. Ele escreve sobre Detroit e a vida em seu blog Leftovers For Dinner.